ESCOBLOG

LITERATURA E INFORMAÇÕES RELACIONADAS À ARTE

Sunday, October 15, 2006

O DIA DE ERCOVAL

O professor, jornal numa mão, pasta noutra, para à porta do café e ajusta o foco a procura dos amigos. Dois deles estão ali, falando sobre secos e molhados. O professor Ercoval senta e, depois de três cervejas, acha tudo muito engraçado. Costumava pedir um expresso, mas o dia foi duro para quem não é de ferro. A fumaça dos cigarros incomoda, mas ele respira. A bunda que sai do café também o perturba, ele nunca comeu um traseiro como aquele. Começa a ficar melancólico e os amigos logo notam que ele está no ponto. O que eles esquecem é que ele está fazendo 47 anos e, para se sentir um pouco feliz, precisa lembrar da festinha dos cinco. Naquela ocasião, seu pai apagou a luz e sua mãe trouxe o bolo da cozinha enquanto seus convidados cantavam parabéns. Agora, como se ligasse de novo a luz, Ercoval não vê nem seu pai, nem sua mãe. Na mesa não há bolo algum; estão ali os amigos que dos meninos daquele dia só têm os olhos. Todo o resto piorou. Então o professor Ercolval tira os óculos e, como não tivessem notado sua ausência, começa uma nova história. Mas todos precisam ir e está tarde para começar uma história que não acabe como esta. Ercoval dá adeus aos amigos e fica pensando que, talvez, alguem, ali no café, o esteja vendo e, quem sabe, escreva uma crônica sobre este velado primeiro de novembro. Imagina que alguns a leiam e num entardecer de outros novembros bebam em nome desta página como brindam pelas escritas por James Joyce para contar o dia de Bloon.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home